quarta-feira, 9 de agosto de 2017

ORIENTAÇÃO JURÍDICA ÀS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE CATADORES(AS) DE MATERIAIS RECICLÁVEIS ACERCA DO DEVER LEGAL DO EXECUTIVO MUNICIPAL INSERI-LOS NA POLÍTICA MUNICIPAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS A PARTIR DA LEI 13.019 DE 2014.



ORIENTAÇÃO JURÍDICA ÀS ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE CATADORES(AS) DE MATERIAIS RECICLÁVEIS ACERCA DO DEVER LEGAL DO EXECUTIVO MUNICIPAL INSERI-LOS NA POLÍTICA MUNICIPAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS A PARTIR DA LEI 13.019 DE 2014.

Consultada por algumas Organizações de Catadores sobre o tema desta orientação jurídica,  sabendo o quanto este tipo de informação é importante para milhares de catadoras e catadores que se organizam em associações e cooperativas por todo o Brasil e por  sentir-me parte e parceira desses coletivos de trabalhadoras e  trabalhadores que, cotidianamente  constroem direitos, cuidam do  meio ambiente  e nos dão lições de dignidade humana e planetária, socializo a presente orientação jurídica:

CONSIDERANDO que a coleta seletiva de resíduos sólidos domésticos faz parte da limpeza urbana e que integra os serviços de saneamento básico;

CONSIDERANDO que o saneamento básico é um serviço público, conforme o caput do artigo 2º da Lei de Diretrizes Nacionais de Saneamento Básico (LDNSB, Lei nº 11.445/2007);

CONSIDERANDO que o saneamento básico é um serviço público e a coleta de resíduos sólidos domésticos o integra, como determina o Art. 3º da Lei 11.445/2007;

CONSIDERANDO que o artigo 7º da LDNSB define quais atividades vinculadas à limpeza urbana e ao manejo de resíduos sólidos urbanos são considerados serviços públicos, citando explicitamente a coleta e a triagem para fins de reuso ou reciclagem;

CONSIDERANDO que o Decreto Federal n.º. 7.404/2010 estabelece que a coleta seletiva deva ser implantada pelo titular do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos e, nos termos do artigo 11 determina: “o sistema de coleta seletiva de resíduos sólidos priorizará a participação de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis constituídas por pessoas físicas de baixa renda”;

CONSIDERANDO que ao coletar, seletivamente, e efetuar a triagem para fins de reutilização ou reciclagem de resíduos sólidos, as associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis prestam um serviço público - a ser prestado ou fornecido através de contratação pelas administrações ou outra forma de remuneração;

CONSIDERANDO  que a Lei Federal 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, é uma medida afirmativa de política pública e destina-se, não somente a estabelecer princípios e diretrizes gerais no manejo dos resíduos sólidos no Brasil, mas, também, a enfrentar a discriminação estrutural que sofre o grupo social vulnerável de catadores de materiais recicláveis em todo o País e tem, como um dos seus princípios, o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania (art. 6º, VIII da Lei 12.305/10);

CONSIDERANDO que, dentre os instrumentos previstos na Lei 12.305/10 para a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, a coleta seletiva e os sistemas de logística reversa relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, assim como o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis é uma exigência (art. 8º, incisos III e IV);

CONSIDERANDO  que um dos objetivos da Política Nacional de Resíduos sólidos é “a integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos” (art. 7.º da Lei 12.305/10), isto por considerar o trabalho dos catadores com a reciclagem uma real possibilidade de efetivar um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil que é a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais. (Art. 3º, III);

CONSIDERANDO  que a Administração Pública Municipal, para atender às exigências legais acima mencionadas poderá estabelecer parcerias e inclusive realizar a contratação das associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis, com dispensa de licitação, com base na Lei 8.666 de 1993, artigo 24, inciso XXVII;

CONSIDERANDO que, além da possibilidade da contratação das associações de catadores pelo poder público municipal, para a realização da coleta seletiva, triagem e destino final ambientalmente adequado, com dispensa de licitação, como informado acima, a Lei 13.019 de 2014, denominada Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, permite também a possibilidade do Executivo Municipal realizar parceria com as Associações e Cooperativas de Catadores, formalizando Termos de Cooperação, com repasse de recurso financeiro, para a realização de atividade de finalidade pública e relevância social, como é o caso do trabalho desenvolvido pelas organizações de catadores nas cidades e que, para isto, deve assegurar orçamento prévio.

Diante do exposto acima, existe base legal tanto para a contratação (lei 12.305 de 2014 e lei 8.666/1993), quanto para a celebração de parcerias, mediante celebração de termo de cooperação (lei 13.019 de 2014), com reporte de recurso financeiro, ou não, sendo que uma possibilidade não exclui a  outra. A prefeitura pode, por exemplo, celebrar uma parceria mediante termo de cooperação, para cessão de espaço, pagamento de água, luz, telefone, etc. e, ao mesmo tempo, realizar a contratação para que o grupo realize a coleta seletiva da cidade. Importante afirmar que, fazendo a opção por apenas uma delas, contratação ou parceria, deve assegurar o máximo de proteção ao trabalho e à dignidade humana das catadoras e catadores de materiais recicláveis e suas organizações.

Orienta-se, nesse sentido,  que o Poder Público Municipal assegure orçamento prévio para a efetivação da Política Municipal de Coleta Seletiva, com prioridade para a contratação, realização de parceria ou inclusive as duas coisas, formalizando a relação jurídica com as organizações de catadores(as), estabelecendo  obrigações recíprocas, prazo de duração e previsão de renovação, para assegurar o cumprimento de seu dever legal.
Belo Horizonte, 09 de agosto de 2017.
Maria do Rosário de Oliveira Carneiro.
OAB/MG 127.04